Sustentabilidade como novo passaporte comercial

Num mundo cada vez mais sensível a critérios de sustentabilidade, as práticas ESG — que integram preocupações Ambientais, Sociais e de Governance — deixaram de ser um simples elemento reputacional para se tornarem um fator crítico de competitividade e de acesso a mercados internacionais.

O conceito de ESG, originado nos mercados financeiros, evoluiu para um critério transversal aplicado por investidores, grandes compradores, reguladores e até consumidores finais. Não se trata apenas de proteger o ambiente ou assegurar boas condições laborais, trata-se de mitigar riscos, garantir resiliência e demonstrar responsabilidade numa cadeia de valor cada vez mais global e exigente.

Hoje, uma empresa que não tenha políticas claras de gestão ambiental, ética laboral, diversidade, prevenção da corrupção ou transparência fiscal arrisca-se a ser excluída de concursos, cadeias de fornecimento e até mecanismos de financiamento. Fundos europeus, bancos multilaterais e instituições financeiras tradicionais estão a incorporar critérios ESG nas suas análises de risco e decisões de crédito.

Por exemplo, o Banco Europeu de Investimento (BEI) exige hoje relatórios de impacto social e ambiental em muitos dos seus programas. O mesmo se aplica a grandes empresas europeias com cadeias de fornecedores exigentes, como grupos do setor automóvel, da moda ou da distribuição alimentar, que já pedem certificações ESG aos seus parceiros.

Neste contexto, a internacionalização sustentável é não só uma exigência ética, mas também uma alavanca estratégica para exportar mais e melhor. Para as PME portuguesas, que representam mais de 90% do tecido empresarial, adotar estas práticas pode abrir portas a novos mercados, garantir maior estabilidade contratual e reforçar a atratividade junto de clientes, parceiros e investidores.

Este artigo, com o propósito de partilha no pprojeto BOW, propõe-se a mostrar como fazê-lo, na prática, com foco em ações concretas, erros a evitar e benefícios reais para empresas que queiram crescer no palco internacional sem deixar ninguém para trás.

 

 

O que não fazer: erros comuns na abordagem ESG

  1. Tratar o ESG como uma obrigação legal ou cosmética
    Muitas empresas veem o ESG como uma moda passageira ou apenas uma exigência de compliance. Esta abordagem reativa resulta em iniciativas descoordenadas, relatórios irrelevantes e nenhuma transformação real.
  2. Ignorar a cadeia de fornecimento
    É comum focar apenas nas práticas internas da empresa e esquecer que os fornecedores também precisam de cumprir critérios ESG. Isso pode comprometer a reputação da empresa exportadora junto de clientes internacionais.
  3. Não envolver a liderança e os colaboradores
    Sem o compromisso da gestão de topo e sem cultura organizacional alinhada com a sustentabilidade, os esforços ESG tornam-se ineficazes e desarticulados. A gestão de topo tem de patrocinar iniciativas que passaram a ser estratégicas na entrada de mercados.
  4. Tentar copiar modelos de grandes empresas
    As PME não devem replicar estratégias de multinacionais com recursos incomparáveis. O ESG deve ser proporcional, relevante e adaptado à realidade da empresa.

O que fazer: integrar o ESG no plano de internacionalização

  1. Mapear riscos e oportunidades ESG por mercado de destino
    Cada mercado tem diferentes sensibilidades: como exemplo na Escandinávia, as preocupações ambientais são centrais; no Canadá ou na Alemanha, a diversidade e a governação são fatores críticos; nos EUA, a transparência fiscal e os direitos humanos estão sob escrutínio.
  2. Criar um plano ESG proporcional à realidade da PME
  • Definir compromissos concretos, como reduzir consumo energético, usar materiais recicláveis, promover igualdade de género ou melhorar práticas de governance.
  • Comunicar essas ações de forma clara e autêntica nos materiais de marketing internacional.
  1. Envolver parceiros e fornecedores
  • Criar códigos de conduta para fornecedores com critérios mínimos.
  • Incluir cláusulas ESG em contratos de exportação ou distribuição.
  1. Usar certificações e reconhecimentos credíveis
  • Certificações como ISO 14001 (ambiental), SA8000 (responsabilidade social) ou B Corp podem ser diferenciais importantes.
  • Aderir a iniciativas como o Pacto Global da ONU reforça o posicionamento responsável.
  1. Alinhar com oportunidades de financiamento e incentivos
  • Programas europeus como o Horizonte Europa ou InvestEU privilegiam projetos com impacto ESG.
  • As entidades bancárias e os seguros de crédito à exportação estão a rever políticas de risco com base em critérios de sustentabilidade.

 

Roteiro prático: primeiros passos para uma PME exportadora

EtapaAção concretaFerramentas/Exemplos
Diagnóstico ESGAutoavaliação interna e da cadeia de valorGuias do IAPMEI, Questionários ESG da UE
PlaneamentoDefinir metas simples e mensuráveisReduzir 20% do consumo de energia, ter 50% fornecedores com boas práticas
ImplementaçãoFormar equipa, rever processos, incluir cláusulas ESGFormação Green Skills, cláusulas em contratos
ComunicaçãoIntegrar nas propostas comerciais e no site“A nossa abordagem ESG” em brochuras e pitch
Melhoria contínuaAvaliar impacto e rever estratégias anualmenteKPI’s ESG anuais com acompanhamento interno

 

O ESG como chave da competitividade internacional

A transição para uma economia sustentável não é uma tendência. É uma exigência regulatória, social e financeira que já está em curso. Ignorá-la é pôr em risco o acesso a mercados, a contratos e a capital. Embora abraçá-la pode tornar-se uma das maiores fontes de vantagem competitiva para as PME exportadoras portuguesas.

Os setores metalúrgico, têxtil e do calçado (fortemente exportadores) já estão a ser pressionados por grandes clientes a adotar padrões ESG. A ATP (Associação Têxtil e Vestuário de Portugal) tem promovido o “moda responsável”; a AIMMAP (Associação das Indústrias Metalúrgicas e Afins de Portugal) incentiva projetos com baixa pegada carbónica; e a APICCAPS (Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado) criou programas para transição digital e ambiental. Estes movimentos não são exceção, são o que chamamos de novo normal.

Integrar a sustentabilidade nos processos, produtos e relacionamentos é, pois, uma forma de garantir resiliência, melhorar reputação e aceder a mercados exigentes com uma proposta de valor moderna e alinhada com os desafios do século XXI.

Além disso, adotar uma estratégia ESG robusta ajuda as empresas a prepararem-se para as exigências crescentes de reporte não financeiro que já se fazem sentir a nível europeu, nomeadamente com a Diretiva de Report de Sustentabilidade Corporativa (CSRD). Quem se adiantar nesta transição ganhará tempo, conhecimento interno e reputação, e poderá posicionar-se como fornecedor preferencial nos mercados mais exigentes.

Por fim, numa altura em que a diferenciação competitiva é difícil de alcançar apenas pelo preço ou pela inovação tecnológica, o compromisso com os princípios ESG torna-se um argumento distintivo e duradouro.

Exportar com sustentabilidade é, cada vez mais, exportar com inteligência estratégica, onde a responsabilidade se transforma em vantagem e a reputação se converte em confiança nos mercados internacionais.

 

Autor: equipa do blog do BOW

Maio 2025

Este artigo faz parte do Projeto BOW 2024/2025.