A maioria das empresas portuguesas que exporta fá-lo para o setor privado. No entanto, existe um universo de oportunidades pouco aproveitado no setor público internacional, que movimenta centenas de milhares de milhões de euros todos os anos. Governos estrangeiros, instituições multilaterais (como a ONU, o Banco Mundial ou o Banco Africano de Desenvolvimento) e programas de ajuda internacional estão constantemente a contratar produtos, serviços e obras (desde equipamentos médicos até soluções de engenharia, formação técnica ou produtos agroalimentares).
Segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC), as compras públicas representam cerca de 13% do PIB mundial. A União Europeia estima que mais de 2 biliões de euros por ano sejam movimentados em procurement público dentro e fora do espaço europeu. Uma parte substancial desses contratos está aberta à participação de empresas estrangeiras (como as PMEs portugueses), desde que estejam preparadas e bem posicionadas.
Este artigo tem como objetivo dar a conhecer os principais canais, requisitos, riscos e passos para que empresas portuguesas possam aceder ao setor das compras públicas internacionais. Relembramos que é um canal exigente, mas muitas vezes mais estável, previsível e estruturado do que o mercado privado.
O que são compras públicas internacionais?
Compras públicas internacionais (ou procurement internacional) referem-se a processos de aquisição lançados por entidades estatais ou multilaterais, com financiamento público ou de doadores, abertos a fornecedores de outros países. Podem incluir:
- Bens: medicamentos, veículos, equipamentos, mobiliário e materiais escolares
- Serviços: formação, consultoria, auditoria e estudos técnicos
- Obras: construção de infraestruturas, instalações elétricas, redes de água e saneamento
Estas compras estão normalmente organizadas em concursos públicos internacionais, com regras de transparência, critérios técnicos e prazos definidos.
Principais canais e plataformas de acesso
Existem dezenas de plataformas internacionais onde as empresas podem aceder a oportunidades reais. Eis algumas das mais relevantes para empresas portuguesas:
| Plataforma / Entidade | Abrangência | Website |
| TED (Tenders Electronic Daily) | Licitações públicas da União Europeia | ted.europa.eu |
| UNGM (United Nations Global Marketplace) | Compras da ONU e agências associadas (UNICEF, UNDP, WFP…) | ungm.org |
| Devex | Projetos financiados por doadores internacionais (USAID, Banco Mundial…) | devex.com |
| World Bank Procurement | Projetos financiados pelo Banco Mundial | projects.worldbank.org |
| ADB Procurement (Asian Development Bank) | Projetos na Ásia-Pacífico | adb.org |
| AfDB Procurement (Banco Africano de Desenvolvimento) | Projetos em África | afdb.org |
| EuropeAid / F&T | Ações externas da UE, cooperação e desenvolvimento | international-partnerships.ec.europa.eu |
Além destas, também há oportunidades a nível bilateral, com governos africanos, latino-americanos ou asiáticos que lançam concursos com base em financiamento externo.
Tipos de oportunidades para empresas portuguesas
Empresas de diversas áreas podem beneficiar do acesso a concursos internacionais. Alguns dos setores com maior potencial:
- Engenharia e construção civil: projetos de infraestruturas, escolas, hospitais, redes elétricas e saneamento
- Serviços de consultoria: estudos de viabilidade, planos estratégicos, auditorias, gestão de projetos
- Equipamentos e bens industriais: sistemas de energia, equipamentos hospitalares, mobiliário escolar
- Formação, capacitação e transferência de tecnologia: educação profissional, e-learning, treinamentos técnicos
- Agroalimentar e logística: fornecimento de géneros alimentícios para ajuda humanitária ou programas escolares
Empresas com produtos diferenciados, experiência em mercados emergentes ou capacidade de entrega logística organizada têm uma vantagem clara neste tipo de processos.
Desafios e erros frequentes
Entrar no universo do procurement internacional exige preparação. Os erros mais frequentes são:
| Erro comum | Explicação |
| Desconhecimento das regras | Cada entidade tem regulamentos próprios, formas de submissão e exigências documentais |
| Falta de certificações | Muitos contratos exigem ISO, registo no UNGM ou provas de capacidade técnica anterior |
| Fraca adaptação das propostas | Apresentar um portfólio genérico em vez de uma proposta alinhada com os critérios específicos do concurso |
| Subestimar os prazos e burocracia | Muitos concursos exigem mais tempo de preparação, aprovação e execução |
| Falta de estratégia comercial | Participar em concursos de forma avulsa e reativa, sem foco geográfico ou setorial |
Como preparar uma entrada estruturada neste mercado
- Identificar se a empresa tem produtos ou serviços aplicáveis: Avaliar se existe compatibilidade entre a oferta da empresa e as necessidades típicas dos concursos internacionais
- Escolher canais estratégicos: Registar-se nas plataformas (ex. TED, UNGM, Devex), criar alertas e acompanhar áreas específicas
- Estudar concorrência e histórico: Avaliar que empresas ganham concursos semelhantes, em que mercados e com que tipo de proposta
- Criar portfólio internacional adaptado: Preparar documentos técnicos, provas de capacidade, certificados e propostas-modelo para submissão
- Participar em missões e sessões de esclarecimento: Acompanhar formações e eventos organizados por AICEP, Banco Mundial ou agências da ONU
- Construir uma rede de parceiros locais: Em muitos concursos é vantajoso ou obrigatório ter parceiros ou consórcios locais
- Preparar contratos e capacidade de execução: Garantir que a empresa pode cumprir prazos, qualidade e condições contratuais internacionais
Casos de referência e oportunidades concretas
- COBA – Consultores de Engenharia e Ambiente tem participado em projetos financiados pelo Banco Mundial em África e América Latina
- Ramos Catarino Engenharia tem experiência em obras públicas em Angola e Moçambique com financiamento internacional
- Bluepharma já forneceu medicamentos para programas de saúde da OMS e Unicef
- Empresas portuguesas do setor agroalimentar participaram em concursos do PAM (Programa Alimentar Mundial) para fornecimento de produtos básicos em Moçambique e Guiné-Bissau
Note-se, a AICEP acompanha várias destas empresas e pode ajudar na leitura dos cadernos de encargos e nas candidaturas. Logo, pode ser uma ajuda no processso.
Fontes e apoios úteis
- AICEP – Business on the Way (BOW) – Apoio à internacionalização, alertas de oportunidades, acompanhamento
- UNGM e Devex – Plataformas de monitorização e candidatura a concursos multilaterais
- Banco Mundial e EU External Action – Guias de procurement, webinars, formação gratuita
- Enterprise Europe Network – Parcerias estratégicas e consórcios europeus
- Portugal 2030 / PRR – Financiamento de capacitação empresarial para exportação
As compras públicas internacionais representam uma avenida de negócio ainda pouco explorada pelas PME portuguesas, mas com enorme potencial. Trata-se de um segmento exigente, com forte base documental, regras claras e concorrência internacional. Porém, é também um mercado onde a previsibilidade, a escala e a reputação institucional jogam a favor de quem se prepara.
Ao contrário da venda direta a empresas privadas, onde o risco de incumprimento e informalidade é mais alto, os concursos públicos internacionais funcionam com regras de transparência, financiamento garantido e avaliação objetiva. São oportunidades de médio e longo prazo, ideais para empresas com visão de crescimento sustentável e ambição global.
Portugal dispõe de talento técnico, boas práticas de engenharia, qualidade em produtos industriais e um crescente know-how em serviços especializados. Transformar essas capacidades em contratos internacionais depende menos de contactos e mais de método, presença digital, certificações e persistência comercial.
O caminho pode parecer complexo, mas os instrumentos estão à disposição. O mundo também compra por concursos. A questão é se as empresas portuguesas estão prontas para concorrer, ou não? Aqui no BOW julgamos que sem e estamos disponíveis para ajudar.
Autor: equipa do blog do BOW
Junho 2025
Este artigo faz parte do Projeto BOW 2024/2025.



