Durante anos, as empresas operaram sob o paradigma VUCA — Volatilidade, Incerteza, Complexidade e Ambiguidade. Este modelo já exigia capacidade de adaptação, mas foi, entretanto, ultrapassado por um novo e mais exigente cenário: o mundo BANI.
O conceito BANI — Frágil, Ansioso, Não-linear e Incompreensível — descreve com maior precisão o contexto atual do comércio internacional. Para as empresas portuguesas que exportam ou pretendem internacionalizar-se, este novo enquadramento obriga a repensar estratégias e estruturas de decisão. Já não basta ter um bom produto e uma rede logística eficiente; é necessário construir modelos de negócio resilientes, inteligentes e preparados para o inesperado.
Abaixo, exploramos cada dimensão do mundo BANI e a sua tradução prática para empresas exportadoras portuguesas:
- Fragilidade — como fortalecer a estrutura da internacionalização
No contexto atual, mercados que ontem eram seguros podem, subitamente, tornar-se inacessíveis ou arriscados (já deu conta do que se está a passar e qual o impacto que tem no negócio internacional?). A guerra comercial, novas barreiras tarifárias, desvalorização cambial ou alterações políticas podem abalar até os contratos mais bem elaborados e resilientes.
Para mitigar a fragilidade no negócio internacional:
- Diversificar mercados de destino: não depender de um único país ou região. Se a empresa exporta sobretudo para a Europa Central, pode explorar oportunidades no Norte de África, América Latina ou regiões específicas da Ásia.
- Redundância na cadeia de fornecimento: ter fornecedores alternativos para componentes críticos ou matérias-primas, especialmente para evitar ruturas em momentos de instabilidade logística.
- Análise de riscos país: incorporar ferramentas de análise de risco geopolítico, sanitário e económico no processo de seleção e monitorização de mercados.
- Ansiedade — gerir a incerteza dentro e fora da organização
O mundo BANI é marcado por decisões urgentes, mudança constante e comunicação que parece um permanente ruido e apelar à distração. Isto gera ansiedade organizacional, tanto nos decisores como nas equipas comerciais e operacionais. E essa ansiedade leva, muitas vezes, à inércia ou ao erro.
Como responder com eficácia:
- Equipas com autonomia e clareza: desenvolver estruturas de decisão ágeis, com liderança distribuída, especialmente nas áreas de exportação, vendas internacionais e operações.
- Rituais de comunicação frequente e transparente: partilhar com as equipas a realidade dos mercados, cenários de risco e decisões estratégicas — mesmo quando o caminho é incerto.
- Formação e atualização contínua: apostar na formação em temas como comércio internacional, cross-cultural management, logística global e negociação em ambientes voláteis.
- Não-linearidade — preparar-se para efeitos e contextos inesperados
No comércio internacional, pequenas mudanças podem gerar efeitos amplificados. Um bloqueio de um canal logístico, a subida súbita de tarifas ou uma nova certificação obrigatória num mercado podem impactar gravemente uma operação bem estruturada.
Adaptar-se à não-linearidade exige:
- Sistemas de planeamento dinâmico: rever forecasts e planos de exportação com frequência (mensal, por exemplo), ajustando rapidamente os objetivos à realidade dos mercados.
- Flexibilidade contratual: negociar cláusulas de revisão em contratos de fornecimento e distribuição internacional que permitam adaptar volumes, prazos e preços em situações excecionais.
- Mentalidade de prototipagem: testar novos mercados ou canais (ex: e-commerce transfronteiriço) com pilotos pequenos antes de grandes investimentos.
- Incompreensibilidade — decifrar a complexidade dos mercados globais
Muitas vezes, os sinais dos mercados são contraditórios ou difíceis de interpretar. Novas regulamentações, mudança nos hábitos de consumo, ou tensões diplomáticas entre países, como estamos a viver, podem criar ambientes difíceis de interpretar — mas que exigem respostas rápidas.
Para ganhar clareza e visão estratégica:
- Monitorização de mercado com fontes diversificadas: não depender apenas de relatórios formais. Usar plataformas digitais, dados de marketplaces, newsletters de câmaras de comércio como a AEP e feedback direto de clientes.
- Apoio de especialistas locais: contar com agentes, distribuidores ou consultores no mercado-alvo que ajudem a “traduzir” contextos culturais, políticos e económicos.
- Investimento em dados e inteligência de mercado: desde ferramentas de CRM integradas com insights de performance, até dashboards de monitorização geopolítica ou cambial.
Proposta para um novo modelo de resiliência internacional
O mundo BANI obriga as empresas portuguesas a repensar não apenas onde e como exportam, mas sobretudo com que modelo mental enfrentam os mercados globais.
Num mundo onde a previsibilidade é escassa, a vantagem competitiva está na capacidade de adaptação rápida, na leitura inteligente dos sinais e na construção de estruturas comerciais resilientes.
Mais do que resistir à mudança, as empresas que prosperarão serão aquelas que:
- Aceitam a complexidade como parte do jogo,
- Estão preparadas para múltiplos cenários,
- Valorizam o conhecimento, a agilidade e a rede de parceiros como ativos estratégicos.
Internacionalizar num contexto BANI não é mais um projeto de crescimento. É uma competência central para a sobrevivência e reinvenção contínua das empresas.
Autor: José Carlos Pereira
Abril 2025
Este artigo faz parte do Projeto BOW 2024/2025


