Um mundo em mudança profunda

Vivemos um momento histórico de redefinição económica global. As forças que durante décadas moldaram o comércio internacional estão a ser desafiadas por novos polos de poder, alterações geopolíticas, instabilidade regional e uma crescente pressão para a autonomização industrial.

O sistema multilateral que já abordamos em outro artigo aqui no blog, construído após a Segunda Guerra Mundial e reforçado com a globalização dos anos 90, está a ser desafiado e mesmo colocado em causa. A guerra comercial entre os EUA e a China, a fragmentação dos fluxos de investimento, a guerra na Ucrânia e o surgimento de alianças alternativas (como o BRICS+) estão a criar um novo mosaico de relações económicas, muito mais complexo e competitivo.

Para as empresas portuguesas, este novo contexto representa tanto desafios inéditos como oportunidades únicas. Adaptar-se à nova ordem económica global já não é uma opção — é uma condição para a sobrevivência e crescimento sustentável.

Este artigo propõe um guia prático sobre o que fazer e o que evitar, com um roteiro que ajuda as empresas portuguesas a navegar esta nova realidade.

 

O que não fazer: erros estratégicos que podem ser fatais

  1. Insistir em estratégias de mercado únicas e tradicionais
    Concentrar esforços apenas em mercados tradicionais como Espanha, França ou Estados Unidos é hoje um risco. A exposição excessiva a poucos mercados pode tornar a empresa vulnerável a choques políticos, económicos ou logísticos.
  2. Ignorar as novas geografias emergentes
    Mercados como o Sudeste Asiático, a África de Leste, a América Central ou os Estados do Golfo estão a crescer rapidamente. Ignorar estas regiões é desperdiçar oportunidades de diversificação e crescimento.
  3. Desvalorizar a necessidade de adaptação cultural e regulatória
    Exportar para novos mercados exige compreender profundamente as suas regras, expectativas, hábitos de consumo e até as dinâmicas políticas locais. Um erro frequente é replicar modelos de venda e marketing sem adaptação local.
  4. Subestimar o risco geopolítico
    As tensões internacionais não são problemas distantes. Podem afetar cadeias de abastecimento, alterar regimes tarifários ou impedir pagamentos. Empresas que não monitorizam o risco geopolítico operam às cegas.
  5. Focar apenas no preço e não no valor
    Em mercados mais exigentes, ganhar quota apenas pela guerra de preços é insustentável. O posicionamento pelo valor (marca, inovação, sustentabilidade) torna-se cada vez mais vital.

 

O que fazer: estratégias para crescer na nova ordem global

  1. Diversificar mercados de forma inteligente
    Não se trata de espalhar recursos indiscriminadamente, mas de construir uma carteira de mercados equilibrada entre maturidade, risco e potencial de crescimento (ferramenta prática: matriz “Attractiveness vs. Fit” para avaliar mercados).
  2. Apostar no conhecimento profundo dos mercados
    Investir em estudos de mercado, missões comerciais, parceiros locais de confiança e plataformas de inteligência de mercado (como a Access2Markets da UE).
  3. Integrar a análise geopolítica nas decisões de internacionalização
    Criar um painel interno de análise trimestral de risco geopolítico por país/região, avaliando: Estabilidade política; Risco cambial; Barreiras comerciais em evolução; Sensibilidade a sanções ou conflitos
  4. Reforçar o soft power empresarial português
    Valorizar a origem (Portugal), o design, a inovação e os valores europeus nas propostas comerciais. Em mercados onde a cultura pesa muito na decisão, ser reconhecido como confiável e ético é uma vantagem competitiva real.
  5. Construir parcerias estratégicas multilaterais
    Participar em feiras, redes de negócio e plataformas multilaterais (como a Enterprise Europe Network ou Câmaras de Comércio Bilaterais) para ganhar tração e contactos em novos mercados.

 

Como reposicionar a estratégia internacional

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Passo 1 – Revisitar o portfólio de mercados atuais: exposição, risco, crescimento.
Passo 2 – Identificar 3 a 5 mercados potenciais de diversificação (baseado em dados, não intuição).
Passo 3 – Estabelecer critérios de seleção claros: tamanho de mercado, facilidade de entrada, alinhamento cultural, estabilidade política.
Passo 4 – Definir planos de entrada adaptados: parcerias, distribuição direta, joint ventures ou canais digitais.
Passo 5 – Construir planos de mitigação de risco geopolítico e financeiro para cada mercado-chave.
Passo 6 – Monitorizar KPIs de internacionalização trimestralmente: vendas, margens, riscos, satisfação de clientes locais.

 

A nova ordem económica global é mais fragmentada, mais incerta e mais competitiva.

Mas é também mais aberta para quem sabe ler os sinais, antecipar movimentos e adaptar-se com rapidez:

  • Diversificação não é dispersão: é proteger o negócio contra riscos concentrados.
  • Conhecimento é poder: vencerá quem souber mais sobre os mercados onde atua.
  • Adaptabilidade cultural e regulatória é chave: flexibilidade de abordagem ganha tração local.
  • Soft power económico importa mais do que nunca: a reputação constrói negócios em mercados difíceis.
  • A análise geopolítica deixou de ser luxo: é agora ferramenta operacional.

Exportar não é um ato pontual — é uma construção contínua de resiliência, credibilidade e inteligência de mercado.

As empresas portuguesas que abraçarem esta mudança com método e ambição irão não apenas sobreviver, mas destacar-se num novo mundo de oportunidades.

A internacionalização deixou de ser apenas um vetor de crescimento. Tornou-se num imperativo estratégico para a solidez e longevidade das empresas.

 

Autor: equipa do blog do BOW

Maio 2025

Este artigo faz parte do Projeto BOW 2024/2025.