A era do hard pragmatismo
Durante décadas, Portugal beneficiou do seu posicionamento como um país de soft power: estabilidade democrática, integração europeia, qualidade de vida, património histórico e capacidade de construir pontes diplomáticas.
No entanto, estamos a assistir a uma mudança profunda. Num mundo cada vez mais multipolar, competitivo e transacional, o soft power tradicional já não é suficiente.
Hoje, os países e as empresas que pretendem destacar-se precisam de combinar influência cultural e reputacional com pragmatismo económico, inovação, resiliência e capacidade real de entregar valor tangível.
Este novo contexto impõe desafios — mas também cria oportunidades únicas para Portugal reposicionar a sua presença internacional, alinhando diplomacia, economia e setor privado numa estratégia mais moderna, ativa e competitiva.
Este artigo oferece uma visão prática sobre: o que já não funciona, o que deve mudar, e como as empresas portuguesas e o Estado podem construir uma nova abordagem de diplomacia económica eficaz.
O que não fazer: erros estratégicos que hoje custam influência e negócios
- Assumir que a simpatia nacional é suficiente para abrir mercados
Portugal é bem visto internacionalmente, mas isso não garante acordos comerciais, investimentos ou influência estratégica. Simpatia sem proposta de valor não gera negócio. - Negligenciar a componente económica da diplomacia
Ainda existem muitas ações diplomáticas focadas apenas em cultura, turismo ou intercâmbio académico, sem ligação direta a plataformas de negócio, investimento ou exportação. - Fragmentar esforços entre organismos
Quando Estado, câmaras de comércio, associações empresariais e empresas operam sem coordenação, a presença internacional de Portugal torna-se invisível ou redundante. - Depender excessivamente dos instrumentos tradicionais multilaterais
O declínio da eficácia de organizações como a OMC ou a ONU exige uma diplomacia económica mais bilateral, regional e pragmática. - Ignorar a importância dos clusters estratégicos
Competir isoladamente é perder força. Portugal precisa de apostar na promoção de setores em conjunto (ex: agroalimentar premium, energias renováveis, tecnologia azul).

O que fazer: construir uma nova diplomacia económica portuguesa
1. Reformular o conceito de soft power para “soft+smart power”
A influência cultural precisa de ser combinada com inteligência económica, inovação tecnológica e presença nos mercados chave.
2. Integrar diplomacia e negócios desde a raiz
Embaixadas e missões diplomáticas devem funcionar como “business hubs”:
– apoio ativo a empresas portuguesas no mercado local,
– promoção de investimentos bilaterais,
– mapeamento de oportunidades setoriais.
3. Criar plataformas coordenadas de presença internacional
Unir esforços de:
– AICEP
– Associações sectoriais
– Câmaras de Comércio Bilaterais
– Startups e scale-ups de tecnologia
4. Investir em novas geografias estratégicas
Fortalecer a presença em regiões emergentes:
– Sudeste Asiático (Vietname, Indonésia)
– Golfo (EAU, Arábia Saudita)
– África Oriental (Quénia, Tanzânia)
– América Latina (México, Colômbia, Chile)
5. Fazer da sustentabilidade e da inovação o novo cartão de visita
Posicionar Portugal como referência em:
– Energias renováveis (hidrogénio verde, solar offshore)
– Agricultura sustentável
– Indústrias criativas digitais
– Tecnologia azul (economia do mar)
Como reposicionar a presença internacional de Portugal
| Passo | Ação Estratégica | Objetivo |
|---|---|---|
| 1 | Redefinir soft power para soft+smart power | Ganhar influência através da inovação e capacidade económica |
| 2 | Transformar missões diplomáticas em hubs económicos | Apoiar diretamente empresas no terreno |
| 3 | Coordenar plataformas público-privadas | Sinergias entre Estado, associações e setor privado |
| 4 | Apostar em geografias de crescimento emergente | Diversificar riscos e criar novas oportunidades |
| 5 | Usar sustentabilidade e inovação como bandeiras | Diferenciar Portugal positivamente no exterior |
Reinventar o espírito dos descobridores na nova ordem global
O tempo da diplomacia “só simpática” acabou. Num mundo em competição aberta por recursos, mercados e influência, quem ficar preso a modelos ultrapassados perderá terreno — invisivelmente e irreversivelmente.
Portugal é, por natureza e história, um país de vocação internacional. Fomos, há mais de cinco séculos, os primeiros a lançar pontes entre continentes, culturas e mercados — numa altura em que o mundo ainda desconhecia os seus próprios limites.
O que nos levou além-mar não foi apenas a curiosidade ou a aventura. Foi a visão estratégica de criar rotas, estabelecer alianças, construir redes de comércio e influência duradouras.
Hoje, enfrentamos um novo mundo. E, tal como nos séculos XV e XVI, o sucesso já não pertence aos que esperam que as condições mudem — mas sim aos que sabem agir com inteligência, persistência e capacidade de adaptação.
No contexto da nova ordem global:
- A competição é feroz, mas as oportunidades são imensas.
- A influência já não se mede apenas em tratados assinados, mas em redes económicas construídas, inovação gerada e valor reconhecido.
- A diplomacia moderna exige menos cerimónia e mais ação concreta: abrir mercados, proteger interesses estratégicos, criar oportunidades para as nossas empresas e talentos.
Portugal tem as ferramentas: Uma imagem externa positiva baseada em paz, qualidade de vida e cultura; Setores de excelência em tecnologia, sustentabilidade, turismo, energias renováveis e agroalimentar premium; Uma rede diplomática experiente e uma geração de empresários mais global e ambiciosa.
Mas precisa de ter também a coragem de se reinventar:
- Atualizar o seu conceito de soft power, para integrá-lo com inovação, competitividade e presença real nos mercados.
- Apostar numa diplomacia económica proativa, que promova Portugal não apenas como um destino turístico, mas como um parceiro de valor nos negócios globais.
- Diversificar geografias, apostando em novas rotas e novas parcerias — tal como outrora fizemos, quando cruzámos oceanos desconhecidos.
Takeaways desta reflexão:
- A influência constrói-se, não se herda.
- As empresas portuguesas são embaixadoras económicas — não podem ficar à margem da estratégia nacional.
- A diplomacia do futuro é feita na confluência entre inovação, negócios e capacidade de adaptação.
- Relembrar o passado não é nostalgia: é inspiração estratégica para agir com ambição no presente.
Se outrora descobrimos mundos novos, hoje a missão é diferente:
Construir relevância sólida e duradoura no concerto das nações, ancorada no talento, no valor económico e na capacidade de inovar.
A história já nos provou que somos capazes. O desafio agora é sermos, mais uma vez, protagonistas — e não meros observadores — num mundo em profunda transformação.
“O futuro pertence não a quem espera, mas a quem constrói relevância nas novas regras do jogo global.”
Autor: equipa do blog do BOW
Maio 2025
Este artigo faz parte do Projeto BOW 2024/2025.


