Porque é que tantos planos de internacionalização falham?

Nos últimos anos, dezenas de empresas portuguesas iniciaram processos de internacionalização — muitas com potencial, outras com produto adequado, algumas até com procura identificada. No entanto, uma parte significativa desses esforços acaba por não gerar resultados consistentes.

Porquê? Porque confundimos estratégia com intenção. Porque tratamos a internacionalização como um projeto paralelo, e não como uma transformação real da forma como a empresa opera. E, acima de tudo, porque falta execução estruturada.

Segundo estudos da McKinsey e da Deloitte, mais de 60% das estratégias de entrada em novos mercados falham não por erro na escolha do país ou do produto, mas por ausência de um plano de execução claro, com responsabilidades, métricas e capacidade de adaptação.

Este artigo é um roteiro prático para ajudar empresas portuguesas — especialmente PME — a desenhar e executar um plano de ação internacional acionável, com base em frameworks de empresas como a BCG, a Deloitte e a McKinsey. O objetivo: transformar vontade em resultado.

A seguir, apresentamos um modelo dividido em 5 etapas essenciais e uma checklist final de 10 passos que qualquer empresa pode seguir para estruturar a sua abordagem aos mercados internacionais.

 

Etapa 1 – diagnóstico 360º da empresa

Antes de olhar para o mercado, a empresa precisa de olhar para dentro.

O que avaliar:

  • Capacidade de produção e resposta logística
  • Saúde financeira e margem de manobra para investimento
  • Preparação da equipa comercial e operativa
  • Inteligência de mercado existente (dados, análises, benchmarks)
  • Posicionamento competitivo da oferta
  • Maturidade digital e canais de comunicação

Ferramenta útil: modelo “export readiness assessment” da Deloitte — uma grelha simples com autoavaliação interna em áreas críticas da prontidão exportadora.

 

Etapa 2 – seleção estratégica de mercados

Em vez de escolher mercados por intuição ou contactos pontuais, aplicar uma abordagem baseada em dados e critérios objetivos.

Modelo sugerido: matriz “market attractiveness vs. company fit” da BCG:

  • Eixo Y = atratividade do mercado (tamanho, crescimento, estabilidade, concorrência)
  • Eixo X = grau de adaptação da empresa a esse mercado (produto, canais, cultura, requisitos legais)

Decisão: atacar mercados com bom “fit” e elevada atratividade; preparar pilotos nos mercados emergentes promissores.

 

Etapa 3 – desenho do plano go-to-market

Cada mercado é único — e requer um plano específico de entrada, posicionamento e atuação comercial.

O que o plano deve incluir:

  • Modelo de entrada (direto, distribuidor, JV, online, parceiro local)
  • Canais de venda e distribuição
  • Política de preços e margens (com simulação de custos)
  • Estrutura de equipa (interna ou com parceiros)
  • Plano de comunicação adaptado ao contexto cultural
  • Roadmap de 12 meses com marcos críticos

Framework útil: “strategic market entry plan” da McKinsey, com ênfase no tripé cliente–canal–capacidade interna.

 

Etapa 4 – definição de KPIs e sistema de execução

O plano só se torna real se for executado com disciplina e acompanhado com dados.

O que medir:

  • Vendas por mercado e canal
  • Taxa de conversão de propostas
  • Tempo médio de entrega
  • Margem líquida por mercado
  • Custo de aquisição de cliente (CAC)
  • Churn de distribuidores ou clientes

Sugestão prática: criar um painel trimestral de exportação com 5–8 indicadores visuais, partilhado com direção e equipas.

 

Etapa 5 – aprendizagem e adaptação contínua

Exportar é uma maratona com sprints curtos. O plano precisa de ser vivo, revisto, adaptado.

Rotinas a implementar:

  • Reuniões trimestrais de revisão de mercado
  • Feedback estruturado de parceiros e clientes
  • Avaliação de ROI por ação internacional
  • Ajustes ao plano de marketing e canal
  • Evolução do produto com base no uso real em cada mercado

Inspiração: o modelo de execução adaptativa da BCG — pequenas correções de rumo frequentes > grandes reformulações tardias.

 

Checklist final – os 10 passos de um plano de ação internacional eficaz

  1. Avaliar a capacidade interna da empresa (recursos, equipa, produto)
  2. Selecionar mercados com base em dados e “fit” real
  3. Desenhar planos de entrada específicos por país
  4. Definir objetivos comerciais concretos e alcançáveis
  5. Estruturar canais de venda, distribuição e comunicação
  6. Planear investimento faseado (marketing, feiras, presença local)
  7. Envolver parceiros com acordos de performance mensurável
  8. Estabelecer métricas de acompanhamento por mercado
  9. Rever o plano de forma trimestral com base em resultados
  10. Criar uma cultura interna de internacionalização, não de projeto pontual

 

Um plano de ação internacional não é um documento — é um compromisso estratégico e operacional

Exportar deixou de ser apenas uma ambição de crescimento. No contexto geoeconómico atual, internacionalizar-se tornou-se uma necessidade de adaptação, diversificação e sustentabilidade do negócio. Os mercados domésticos são limitados, os ciclos económicos cada vez mais curtos e os riscos, cada vez mais globais. A internacionalização é, hoje, uma das formas mais eficazes de diluir riscos, alargar horizontes e construir um posicionamento de longo prazo.

Mas atenção: internacionalizar com sucesso não tem nada a ver com sorte, contactos esporádicos ou decisões oportunistas. Tem tudo a ver com estrutura. Com processo. Com disciplina. Com visão clara e execução consistente.

Um plano de ação internacional não é um documento estático com boas intenções — é uma ferramenta viva, que se desenha com base em dados, se ajusta com feedback real e se transforma num ritual operativo de gestão. É nele que se liga a estratégia da empresa às realidades do terreno: custos logísticos, negociação com parceiros, formação de equipas, vendas, comunicação e pós-venda.

Além disso, um bom plano serve para alinhar toda a organização: a administração, os comerciais, a produção, o marketing e a equipa financeira. Todos sabem para onde se quer ir, o que está previsto, quem é responsável por quê, e como se mede o progresso. Cria clareza. Cria compromisso. Cria foco.

As empresas portuguesas que lideram nos mercados internacionais não são as maiores — são as que fazem melhor execução (o segredo está quase sempre na execução e na qualidade das equipas que executam). Sabem o que medir. Sabem quando ajustar. Sabem ouvir o mercado. E sabem manter a ambição com os pés bem assentes na realidade.

Por isso, mais do que perguntar “para onde podemos exportar?”, a pergunta certa é:

Estamos preparados para executar um plano internacional com foco, método e aprendizagem contínua?

Se a resposta for “sim”, então há tudo para correr bem — mesmo num mundo instável.
Se a resposta for “não”, este é o momento de começar a preparar essa base. Porque a vantagem competitiva, neste novo ciclo, vai pertencer a quem tem planos executáveis, não apenas visões inspiradoras.

 

Autor: equipa de conteúdos do BOW

Abril 2025

Este artigo faz parte do Projeto BOW 2024/2025.