A DIATOSTA, grupo 100% familiar sediado em Aveiro, iniciou a sua atividade em 1977 e é especialista na produção de tostas e minitostas. E os números são incríveis, senão veja-se: mais de 400 colaboradores, com uma capacidade diária de produção de 90 toneladas, o que equivale a mais de 36 milhões de tostas/dia.
Este artigo tem por base a rubrica Business Advisory do projeto BOW. Estas entrevistas têm como objetivo a partilha de percursos de internacionalização, de empresas e gestores, que se destacam pelas suas boas práticas e resultados nos mercados internacionais. Estamos convictos que podem servir de exemplo e de modelagem para empresas com menor pendor exportador.
O market share do mercado português está acima dos 80% e exporta 64% da sua produção para mais de 52 mercados. Os 3 pilares do negócio são: fabricação de tostas de marca própria; fabricação de projetos private label; e contract manufacturing.
É a única empresa em Portugal especializada no fabrico exclusivo de tostas. Conta com 5 Unidades de Produção, com 10 linhas de produção e 2 Centrais de Distribuição. Possui, ainda, uma empresa subsidiária em Salamanca, detida em 100% pela casa-mãe, para a comercialização dos seus produtos em Espanha. E o volume de vendas de todas as estruturas somadas (não consolidadas) rondou os 47 milhões de euros em 2021.
Todos estes anos de experiência e o constante investimento no desenvolvimento de produtos, em formação da sua equipa, em alta tecnologia, na sofisticação do layout produtivo e na construção de infraestruturas concederam à DIATOSTA um reconhecido e importante estatuto de empresa líder de mercado.
A empresa é detentora das marcas registadas DIATOSTA – marca de fábrica – e TOSTAGRILL, MINIGRILL e GRIELLE – marcas de produtos –, produzindo ainda para várias marcas próprias em diversos continentes. Nesta entrevista, Vítor Barbosa, export manager, passa, de forma brilhante e interessante, a sua experiência de quase 30 anos em mercados internacionais. Vale mesmo a pena ler, pois traduz o “pensar o negócio internacional”, cruzando o marketing e as vendas.
AEP – O que vos distingue na DIATOSTA como empresa nos mercados internacionais? Qual a vossa proposta de valor?
VB – Os modelos de abordagem aos mercados são muitos, desde a marca própria ao private label e ao contract manufacturing, embora assuma que a nossa abordagem é diferenciadora, pois estudamos a sério os clientes, numa ótica de custo de aquisição do nosso produto, assim como do seu LTV (Life Time Value). Nós preocupamo-nos muito em ajudar o nosso cliente a vender, mais do que a vender apenas as nossas tostas nos seus diferentes formatos. Se assim não fosse, como conseguiríamos estar no número de mercados em que estamos? Pois a tosta em si, como produto, é percecionada como uma commodity.
A estratégia, e com muito arrojo, foi tentar ter menor peso do private label e baixar o custo de todo o desenvolvimento, pois muitos dos desenvolvimentos à medida, por vezes, não vão ao encontro das propostas de encomenda no início do projeto (sendo esse risco 100% nosso). E o objetivo é conseguir que o desenvolvimento seja reconhecido como algo de valor e com um investimento financeiro associado. Não damos valor ao que não tem preço (nem que seja apenas como perceção!). E, aos poucos, estes projetos passam a poder ser uma inovação para nós próprios no futuro, pois também aprendemos no processo.
Temos a syster company que tem o nome de RIALTO (faz 38 mercados), que se preocupa com os produtos de grande taxa de rotatividade, com produtos de valor acrescentado e diferenciados (os que chamamos premium). E a DIATOSTA é a mother company. A complementaridade ajuda na força da oferta e na tal luta de espaço nos lineares da grande distribuição.
A maior curiosidade dos resultados dos nossos estudos é que o produto substituto não são as outras tostas, mas sim o pão de forma. A tosta é uma commodity (“pão seco”), como referi; logo, só nos podemos diferenciar pelo nível de serviço que oferecemos e pela qualidade dos serviços oferecidos pelas nossas pessoas/equipas.
Na grande distribuição, a luta é por mais espaço no linear. E a distribuição moderna tem cada vez mais força perante um produtor como nós. Aonde é que vamos vender as nossas tostas? – foi uma das perguntas na formulação da estratégia. Tentar estar junto ao pão de forma é uma das estratégias para educar o cliente a comprar (isto no mercado nacional); pois, em locais mais tradicionais, ao lado do pão seria mais difícil.
Temos todas as certificações: as que nos exigem e aquelas que estrategicamente permitem estar na liderança de standards futuros nos mercados mais sofisticados e regulados no ecossistema agroalimentar mundial. E estamos em processo de aprendizagem contínuo, investindo muito em tecnologia. Há normas que passam por auditorias de capacidade produtiva e gestão de stock, mas também de foodsafety e responsabilidade social. E no limite, como curiosidade, temos até auditorias de mitigação de “ações antiterrorismo” com o maior retalhista a nível mundial.
AEP – O que vos move e motiva no negócio internacional e na abertura de novos mercados? Como escolhem e selecionam mercados? Quais os critérios mais relevantes no vosso negócio?
VB – O peso da exportação nas vendas é de 64% (não considerando Espanha como exportação). Estrategicamente, o futuro será baixar a idade do nosso consumidor recorrente. Lançar novos produtos na componente healthy e de super seeds. O problema dos exportadores portugueses, e de um player como a DIATOSTA, é a escala. E queremos crescer nas nossas marcas próprias. Tem sido esse o caminho, e estamos a conseguir consolidar esta estratégia. A liderança da família Lameiro ajuda no processo, devo reconhecer isso.
Logo, o que nos distingue é o processo de conveniência, a inovação e a dinâmica da nossa equipa de marketing e desenvolvimento (das receitas do produto ao packaging). E é isso que o nosso cliente valoriza. Novos formatos, quase únicos, como o das doses individuais. Até em canais que muitos não exploram. O segredo está no estudo e ajuste ao processo de compra. Somos muito flexíveis e rápidos a desenvolver receitas.
Trabalhamos diretamente os grandes retalhistas internacionais. Em alguns mercados, via importador/distribuidor local; excecionalmente, com brokers, a antiga típica figura do agente comercial. Lemos tendências para tentar compreender os mercados mais sofisticados, como por exemplo o americano. A equipa de vendas, marketing e inovação têm de funcionar como um todo que comunica entre si e para fora. Até na velocidade com que respondem aos desafios dos mercados e dos clientes.
O que o cliente valoriza é o que nos preocupa. Fomos dos primeiros a ajustar o produto e a comunicar na embalagem, o que move o cliente a comprar. Terminamos com o óleo de palma há algum tempo (o que nos prejudica, hoje, devido ao preço do óleo de girassol). Todos os materiais de embalagem são recicláveis. Há uma preocupação e um investimento significativo desde o nível da pegada de carbono à componente social e das comunidades que impactamos. E temos alocado significativos recursos em comunicação, apontando mais para os benefícios das tostas do que para as suas características – o foco passou a ser nos atributos funcionais do produto.
Saliento um trabalho muito interessante no nosso plano de marketing a 3 anos, com revisão anual. Este plano desaguou em muitas ações que impactaram o mercado e envolveu várias equipas internas. Julgo que foi este plano uma das alavancas do nosso posicionamento e liderança atual. Os nossos novos projetos são avaliados quantitativamente e também qualitativamente. Temos indicadores bem definidos para cada ação e somos muito rigorosos na sua medição. E, se medimos, estamos a controlar e a corrigir quando necessário. Gostava muito que todos os planos fossem perfeitos, mas não são. A vantagem competitiva é ser rápido a ajustar. “Ser o vento e não a bandeira” é, na minha opinião, um dos lemas de quem quer liderar o mercado internacional.
AEP – Quais os maiores desafios nestes últimos dois anos com um enquadramento novo, incerto, com muita imprevisibilidade e variáveis não controláveis? E este novo momento de fevereiro de 2022 com a guerra, pois, segundo sei, exportavam para a Ucrânia?
VB – Deixamos de viajar – a nossa equipa e todos os outros. Inclusive os compradores. Não existiu um ganho significativo de grandes clientes, mas baixámos bastante os custos diretos em viagens e feiras, aumentando significativamente a nossa taxa de fidelização, embora sem crescimento da nova carteira de clientes. Crescemos foi nos atuais clientes. E agora já estamos a apontar para a renovação da carteira com novos clientes.
O “mercado da saudade” quase não tem peso, ao contrário de outras empresas do agroalimentar. Estamos num negócio de puro mass market e não étnico. Logo, o branding Portugal não é assim tão relevante, embora tenha exemplos pontuais do contrário, pois temos orgulho em ser uma fábrica portuguesa. Num mercado da América Latina, utilizamos mesmo, a pedido do cliente, o “hecho en Portugal” e a nossa bandeira. Em muitos mercados, a perceção que o consumidor tem é que as padarias portuguesas são as melhores do mundo. Daí que aproveitemos esta perceção para vender em alguns mercados, embora não seja o nosso posicionamento global.
Dentro do mercado do Leste europeu, estávamos a crescer de forma consolidada no mercado da Ucrânia até ao dia 24 de fevereiro, via um importador local (que estava a fazer um bom trabalho). Saliento que o mercado da Polónia, que está ao lado, é dos nossos principais mercados de exportação. Fomos criando marcas nos últimos anos na Ucrânia, e as 4 principais são vendidas por nós. Da tosta francesa à tosta italiana, são nossas. Note-se que foi temporariamente tudo interrompido nas duas primeiras semanas de guerra. Embora nas últimas semanas tenhamos regressado em força.
Com a guerra, passámos a ter saídas semanais para a Ucrânia, pois dos piores cenários surgem oportunidades, em benefício da população local. O pão é um bem essencial, e muitas das padarias, infelizmente, estão paradas ou destruídas. E a tosta passou a ser um substituto do pão no mercado, pois tem um tempo de validade alargado (assim como conveniência). Logo, em situações de crise, a tosta pode ser incorporada no cabaz de compras. Foi o que aconteceu. O importante é estarmos junto de quem compra, sempre a entregar soluções e resultados. E, acima de tudo, ajudar os nossos compradores a vender, preferencialmente a nossa oferta! Algumas das principais marcas do mundo das tostas são fabricadas em Aveiro. E isso orgulha-nos muito.
AEP – Como se prepararam ou adaptaram internamente a estes tempos mais turbulentos e incertos – especialmente a equipa de vendas e exportação?
VB – A imprevisibilidade nunca esteve tão elevada, embora com a pandemia reconheça que crescemos devido aos hábitos de compra, mais até que dos hábitos de consumo. Estamos a ser fortemente condicionados pelo preço da energia e pelo preço da principal matéria-prima, a farinha. Não é fácil, mas a nossa administração é audaz e corajosa, e os investimentos continuam em curso. Estamos a produzir, nesta fase, mais 37% do que em 2019, antes da pandemia – não existindo uma relação direta na rentabilidade, pois o peso do private label e contract manufacturing cresceu. O objetivo é aumentar a nossa marca; esse é o principal foco.
Os mercados que abordamos como apetentes à compra têm de ter 3 características: massa crítica no consumo (número de pessoas); faixa etária de consumo baixa; e interessados, como hábito diário, no consumo de tostas. Dou o exemplo do mercado indiano: marca pontos nos dois primeiros indicadores, mas não no terceiro. Tem muita gente, gente jovem, mas o tipo de tostas que consomem tem quase 30% de açúcar (estamos nas tostas que vendem saúde), pois as tostas são utilizadas para adoçar o chá. Cada mercado tem as suas especificidades e tem de ser estudado.
AEP – Qual a sua opinião sobre o projeto BOW em anteriores participações: quais foram e como correram? A AEP Internacional e a sua equipa fazem a diferença? Porquê?
VB – Fazemos muitos eventos com a AEP. Temos um plano de feiras ambicioso e neste processo reconheço o valor da equipa da AEP, que acrescenta muito valor na nossa presença. Temos de aparecer, de estar e demonstrar que estamos presentes em muitos mercados estratégicos para nós. A Gulfood no Dubai é um bom exemplo. Fizemos a última em fevereiro de 2022 e já estamos inscritos na próxima. Com uma entidade como a AEP, maximizamos a eficácia de presença no mercado, assim como algumas portas institucionais se abrem mais facilmente.